Só a Arte Sacra pode ser Cristã?

Pelas altas janelas, guarnecidas de vitrais, entra uma luz abundante mas suave, que se reflete no soalho, no metal polido das armaduras e das panóplias, no bronze e no cristal dos imensos candelabros, e parece atingir a custo as nervuras e pinturas do teto.

Sala de um castelo medieval impregnado de espírito cristão

Sala de um castelo medieval impregnado de espirito cristão
As colunas, fortes e delicadas, se abrem ao alto como imensas palmeiras que protegessem a sala com sua ramagem de pedra, de linhas coerentes, nítidas e suaves.

A sala é fortemente impregnada de um ambiente peculiar, que convida a um repouso sem ócio nem dissipação, um repouso todo feito de recolhimento, gravidade, equilíbrio e força.

Mount Stuart Sala do Castelo
As armaduras, os veados empalhados, enriquecem este ambiente com o eco das proezas praticadas na caça e na guerra.

Os lambris de madeira trabalhada quebram com sua delicadeza e aconchego o que a austeridade da pedra talvez tivesse de excessivo. Ao fundo, sobre uma peanha, a imagem de um Santo atrai o pensamento para o Céu.

Sem dúvida esta sala espelha uma mentalidade, que poderá agradar a uns, desagradar quiçá a outros, mas que de um modo ou de outro soube dispor admiravelmente das cores e das formas para se exprimir.

É uma sala de uso civil quotidiano. Apresenta o ambiente em que o espírito de nossos maiores se sentia à vontade para viver a vida corrente.

A Sainte Chapelle de Paris construída por São Luiz para conter alguns espinhos da coroa de Nosso Senhor Jesus Cristo

A Sainte Chapelle de Paris construida por São Luiz para conter alguns espinhos da coroa de Nosso Senhor Jesus Cristo
A Sainte Chapelle de Paris, construída no séc. XIII por S. Luis IX, Rei de França, para conter alguns espinhos da coroa de Nosso Senhor Jesus Cristo, exprime a mesma mentalidade, não enquanto entregue à vida diária, mas enquanto voltada para a prece.

Sainte Chapelle, parte inferior
A nota de delicadeza atinge ao sublime. Nem por isto a força, o equilíbrio, a gravidade, o recolhimento perdem algo da sua plenitude. Eclesiásticos, artistas, peregrinos de lodos os séculos têm visto na Sainte Chapelle, no ambiente que nela palpita, na mentalidade expressa em suas linhas, suas cores, suas formas, sua configuração geral, a expressão arquetípica da alma cristã.

A alma cristã deixa uma marca inconfundível com que exprime tudo quanto faz

Cristã é a sala como cristã é a capela. E isto não só pelo efeito das imagens e símbolos religiosos que ali se encontram, como pelo ambiente que ali se respira, pela mentalidade que fica subjacente a este ambiente.

De onde se chega a uma noção mais ampla. Uma obra de arte não é cristã pelo simples fato de estar coberta de símbolos de nossa santa Religião, como um homem não se faz frade pelo simples fato de vestir burel.

É preciso que seja católica a alma que na obra de arte palpita, para que esta se possa dizer genuinamente cristã.

E o ambiente cristão não é susceptível de impregnar apenas um edifício destinado ao culto, mas qualquer local que tenha em sua configuração a marca inconfundível com que a alma cristã exprime tudo quanto faz.

(Plinio Corrêa de Oliveira em Catolicismo, Dezembro de 1952)
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Comentários sobre a fisionomia de Santa Maria Eufrásia Pelletier

Velhice: Decrepitude ou Apogeu?

Em número anterior (veja aqui), fizemos o confronto entre as fotografias de Churchill moço e velho, para mostrar como se engana o mundo moderno quando só vê no envelhecimento uma decadência.

Quando se prezam mais os valores do espírito, envelhecer é crescer

Quando se sabe prezar mais os valores do espírito do que os do corpo, envelhecer é crescer no que o homem tem de mais nobre, que é a alma, se bem que signifique a decadência do corpo, que é apenas o elemento material da pessoa humana.

E que decadência! Bem pode ser que o corpo perca sua beleza e seu vigor. Mas ele se enriquece com a transparência de uma alma que ao longo da vida soube desenvolver-se e crescer. Transparência esta que constitui a mais alta beleza de que a fisionomia humana seja capaz.

Rosa Virginia Pelletier (Santa Maria Eufrasia Pelletier)
Santa Maria Eufrásia Pelletier, nascida na Vandéa, França, em 1796, fundadora de uma Congregação docente feminina, faleceu em 1868. Sua festa se celebra no dia 24 de abril.

Nada do que significa formosura lhe faltou na mocidade: a correção dos traços, a beleza dos olhos e da cútis, a distinção da fisionomia, a nobreza do porte, o viço e a graça da juventude. Mais: o esplendor de uma alma clara, lógica, vigorosa, pura, se exprimia fortemente em sua face. É o tipo magnífico da donzela cristã.

Santa Maria Eufrasia Pelletier
Ei-la em sua ancianidade. Do encanto dos antigos dias resta apenas um vago perfume. Mas outra formosura mais alta brilha neste semblante admirável.

O olhar ganhou em profundeza; uma serenidade nobre e imperturbável parece prenunciar nele algo da nobreza transcendente e definitiva dos bem-aventurados na glória celeste!

O rosto conserva o vestígio das batalhas árduas da vida interior e apostólica dos Santos. Atingiu algo de forte, de completo, de imutável: é a maturidade no mais belo sentido da palavra.

A boca é um traço retilíneo, fino, expressivo, que traz a nota típica de uma têmpera de ferro. Uma grande paz, uma bondade sem romantismo nem ilusão, com algum resto da antiga beleza, esplende ainda nesta fisionomia.

O corpo decaiu, mas a alma cresceu tanto, que já está toda em Deus

O corpo decaiu, mas a alma cresceu tanto, que já está toda em Deus, e faz pensar na palavra de Santo Agostinho: nosso coração, Senhor, foi criado para Vós, e só está em paz quando repousa em Vós.

Quem ousaria afirmar que para Santa Maria Eufrásia, envelhecer foi mesmo decair?

Aspirações de Santa Maria Eufrásia

Ó meu Deus, fazei que cada batida de meu coração seja uma súplica para alcançar graça e perdão para os pecadores.
Que cada uma de minhas respirações seja um apelo à Tua infinita misericórdia,
que cada olhar meu, atraia para Vós as pessoas que eu fitar e lhes revele o Teu amor.
Que o alimento de minha vida seja trabalhar sem descanso pela Tua glória e pela salvação das almas. Amém.

Fontes:
Plinio Corrêa de Oliveira em Catolicismo, novembro 1952
http://www.buonpastoreint.org
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São Leão Magno

São Leão MagnoSão Leão Magno
Permaneceu célebre um episódio da vida de São Leão Magno. Ele remonta a 452, quando o Papa em Mântua, juntamente com uma delegação romana, encontrou Átila, chefe dos Hunos, e o dissuadiu de prosseguir a guerra de invasão com a qual já tinha devastado as regiões nor-orientais da Itália. E assim salvou o resto da Península. Este importante acontecimento tornou-se depressa memorável, e permanece como um sinal emblemático da acção de paz desempenhada pelo Pontífice.
São Leão Magno detem o avanco de Atila e salva Roma
A seguir dizeres muito apropriados de São Leão Magno para nossos dias.

Recomeçar sempre!

Não desista nunca,
Nem quando o cansaço se fizer sentir,
Nem quando os teus pés tropeçarem,
Nem quando os teus olhos arderem,
Nem quando os teus esforços forem ignorados,
Nem quando a desilusão te abater,
Nem quando o erro te desencorajar,
Nem quando a traição te ferir,
Nem quando o sucesso te abandonar,
Nem quando a ingratidão te desconsertar,
Nem quando a incompreensão te rodear,
Nem quando a fadiga te prostrar,
Nem quando tudo tenha o aspecto do nada,
Nem quando o peso do pecado te esmagar…

Invoque Deus, cerre os punhos, sorria… E recomece!

Ricomincia Sempre (em italiano)

Non ti arrendere mai,
neanche quando la fatica si fa sentire,
neanche quando il tuo piede inciampa,
neanche quando i tuoi occhi bruciano,
neanche quando i tuoi sforzi sono ignorati,
neanche quando la delusione ti avvilisce,
neanche quando l’errore ti scoraggia,
neanche quando il tradimento ti ferisce,
neanche quando il successo ti abbandona,
neanche quando l’ingratitudine ti sgomenta,
neanche quando l’incomprensione ti circonda,
neanche quando la noia ti atterra,
neanche quando tutto ha l’aria del niente,
neanche quando il peso del peccato ti schiaccia…

Invoca il tuo Dio, stringi i pugni, sorridi… e ricomincia!

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A Salve Rainha

Salve Rainha

Depois do Padre Nosso e da Ave Maria, não há oração tão profunda, formosa e simples como a Salve Rainha, que desde os primeiros momentos de sua aparição, em fins do século X, foi recebida pela Igreja e adotada pela Cristandade, e se reza a cada dia em todos os lares e em todos os templos católicos, desde os mais suntuosos até os mais humildes.

Nada há de estranho que assim seja, pois esta preciosa oração reúne as condições de toda oração para ser perfeita, segundo a doutrina do Anjo das Escolas [São Tomás de Aquino]: pedir com instância uma graça determinada e estar ela ordenada à vida eterna (cfr. Suma Teológica, IIa IIae, q. 83, a. 17).

Por meio dela, sempre que nos sentimos angustiados pelas provas e amarguras da vida, recorremos ao trono celestial da Virgem, tesouro inesgotável de proteção e de consolo, saudando-a primeiramente com aquelas invocações de Rainha e Mãe de misericórdia, vida, doçura e esperança nossa, que resumem todos os motivos que temos para acudir a ela com filial e ilimitada confiança; expondo-lhe depois nossa triste condição de desterrados neste vale de lágrimas, através do qual caminhamos dolorosamente, como Ela caminhou um dia; pedindo-lhe, por último, que nos proteja com o dulcíssimo olhar dos seus olhos misericordiosos, e no final de nossa peregrinação mostre-nos Jesus, que é a ressurreição e a vida eterna. […]

Tantas são, com efeito, as belezas desta peregrina oração, tão profundos seus pensamentos, tão felizes suas expressões, que os historiadores da Idade Média, mais artistas que críticos, tais como João Eremita e Alberico de Trois Fontaines (aos quais mais tarde seguiram-se o grande canonista Alpizcueta e a Venerável Maria de Ágreda), acreditaram que tivesse origem angélica. […]

Várias nações reivindicaram sua paternidade, apresentando seus filhos mais preclaros como autores da grande oração mariana.

Mas, revisados pela crítica os títulos apresentados, foram se desfazendo muitos deles, e na hora presente não há mais que três escritores que podem aspirar à honra de terem composto a Salve Rainha: o germânico Hermann Contractus, o francês Aymar de Puy e o espanhol São Pedro de Mezonzo*.
Salve Regina
Oração da Salve Rainha

Salve, Rainha, Mãe de misericórdia,
vida, doçura, esperança nossa, salve!
A vós bradamos os degredados filhos de Eva.
A vós suspiramos, gemendo e
chorando neste vale de lágrimas.

Eia, pois, advogada nossa, esses
vossos olhos misericordiosos a nós volvei,
e depois deste desterro mostrai-nos Jesus,
bendito fruto de vosso ventre.
Ó clemente, ó piedosa, ó doce Virgem Maria.

Rogai por nós, Santa Mãe de Deus.
Para que sejamos dignos das promessas de Cristo.

Salve Regina em latim

Salve, Regina, Mater misericordiae,
vita, dulcedo, et spes nostra, salve.
Ad te clamamus, exsules filii Hevae,
ad te suspiramus, gementes et
flentes in hac lacrimarum valle.

Eia, ergo, advocata nostra, illos
tuos misericordes oculos ad nos converte;
et Jesum, benedictum fructum ventris tui,
nobis post hoc exilium ostende.
O clemens, O pia, O dulcis Virgo Maria.

Ora pro nobis sancta Dei Genetrix.
Ut digni efficiamur promissionibus Christi.

__________
Nota: o texto acima foi extraído do prólogo da seguinte obra:
Pe. Dr. Javier Vales Failde, La Salve Explicada, Tipografia de “El Eco Franciscano”, Santiago de Compostela, 1923.
* Nota da redação: Segundo uma tradição surgida no século XVI, São Bernardo, movido por inspiração divina, teria acrescentado as três invocações finais “Ó clemente, ó piedosa, ó doce sempre Virgem Maria”. Mas há contra isso o silêncio dos contemporâneos do santo, e o fato de que o argumento da oração e sua conclusão sugerem um mesmo autor. (Cfr. H. T. Henry, Salve Regina, The Catholic Encyclopedia, Volume XIII, Copyright © 1912 by Robert Appleton Company, Online Edition Copyright © 2003 by K. Knight).

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A Coroa de Espinhos do Salvador

A Coroa de Espinhos

A Coroa de Espinhos do Salvador

Pilatos então tomou Jesus e mandou-o açoitar. E os soldados, tecendo uma coroa de espinhos, puseram-lha sobre a cabeça” Jo. 19, 1-2).

Narra a Tradição que a santa Coroa de espinhos, referida nessa passagem do Evangelho de São João, foi recolhida pelos discípulos do Divino Salvador e conservada até o• ano de 1063 no monte Sion, em Jerusalém.

Coube a São Luis IX, rei de França, a glória de ter adquirido do Imperador de Bizâncio, em 1239, essa relíquia inestimável. Para abrigá-Ia condignamente, mandou construir a mais bela jóia arquitetônica em estilo gótico existente na Europa: a Sainte Chapelle de Paris.

Atualmente, a santa Coroa de espinhos pode ser venerada na Catedral de Paris, onde se encontra pro­tegida por fino anel de cristal (acima), sob a custódia dos Cavaleiros do Santo Sepulcro de Jerusalém. Esta Ordem Militar foi fundada por Godofredo de Bouillon, célebre general cristão que conquistou a Terra Santa aos sarracenos, em 1099, e recusou ser coroado de jóias no local onde Nosso Senhor houvera sido coroado de espinhos.
relicario para a Coroa de Espinhos de Nosso Senhor Jesus Cristo
Ao longo dos séculos, vários relicários foram elaborados pela piedade católica para guardar a sagrada relíquia. O mais belo e rico deles, foi desenhado em 1853 por indicação de Viollet­le-Duc, o famoso arquiteto que restaurou Notre Dame de Paris.
São Luis IX segurando a coroa de espinhos, detalhe do relicário
A base do relicário, em estilo neogótico, representa São Luiz IX, Santa Helena e o Imperador latino de Bizâncio, Balduíno de Courtenay, que sustentam uma coroa de flores-de-lis, cujas pilastras são, por sua vez, apoiadas em doze estátuas representando os Apóstolos.

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Senhor Santo Cristo dos Milagres; devoção secular dos Açores – II

Senhor Santo Cristo dos Milagres

Hoje concluimos esta série de artigos publicando orações e o hino em louvor do Senhor Santo Cristo dos Milagres.

Oração ao Senhor Santo Cristo

Ó bom e amantíssimo Jesus, que por amor das nossas almas quisestes ser açoitado, coroado de espinhos e considerado como rei de comédia no Pretório de Pilatos, dando-nos o exemplo máximo de humildade, fazei que atraídos pela Vossa face adorável, não tenhamos outro pensamento que não seja para Vos louvar, outro desejo que não seja o Vosso amor.

Fazei, Senhor, que a nossa vida seja sempre iluminada pelos clarões da Vossa Sagrada Paixão, a fim de, nas contrariedades, sentirmos a Vossa força, nas aflições, a Vossa consolação, nas dores o Vosso refrigério, nas tristezas, a Vossa alegria, chegando assim incólumes ao Vosso Reino Eterno. Amém.

Novena ao Senhor Santo Cristo dos Milagres
Senhor Santo Cristo dos Milagres, no seu altar

Meu Jesus, em Vós depositei toda minha confiança.
Vós sabeis de tudo Pai e Senhor do Universo.
Sois o Rei dos Reis.
Vós que fizestes o paralítico andar, o morto voltar a vida, o leproso sarar.
Vós que vedes minhas angústias, as minhas lágrimas, bem sabeis Divino Amigo como preciso alcançar de Vós esta grande graça (pede-se a graça com fé).
A minha conversa convosco,
Mestre, me dá ânimo e alegria pra viver.
Fazei Divino Mestre que antes de terminar esta conversa que terei convosco durante 9 dias, eu alcance esta graça que peço com fé.
Como gratidão, publicarei esta oração para outros que precisam de Vós, e aprendam a ter fé e confiança na Vossa Misericórdia.
Ilumine meus passos, assim como o sol ilumina todos os dias o amanhecer e testemunha a nossa conversa Jesus tenho confiança em Vós, faça aumentar minha fé
cada vez mais.

Rezar nove dias seguidos.

Hino ao Senhor Santo Cristo dos Milagres
Senhor Santo Cristo dos Milagres
O Hino do Santo Cristo foi composto, nos anos setenta do século XIX, pelo músico Candeias, da Banda Militar de Ponta Delgada.

“Glória a Cristo, Jesus, glória eterna,
Nosso Rei, nossa firme esperança,
Soberano que os mundos governa
E as nações recebem por herança.
Com o manto e o ceptro irrisório,
Sois de espinhos cruéis coroado,
Rei da dor, uma vez, no Pretório,
Rei de amor, para sempre adorado.

Combatendo, por vossa Bandeira
Que, no peito, trazemos erguida,
Alcançamos a paz verdadeira
E a vitória nas lutas da vida.

Só a vós, com inteira obediência
Serviremos com firme vontade,
Porque em Vós há justiça e clemência
Porque em Vós resplandece a verdade.

Concedei-nos, por graça divina,
Que sejamos um povo de eleitos,
Firmes crentes na Vossa doutrina,
Cumpridores dos Vossos preceitos”.

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Senhor Santo Cristo dos Milagres; devoção secular nos Açores – I

Senhor Santo Cristo dos Milagres

Há três séculos a população daquele arquipélago cultua com ardor imagem admirável de Cristo padecente – “Ecce Homo” – por intermédio da qual têm-se operado, de modo contínuo, esplêndidos milagres.

Uma das devoções mais ricas em significado, e que se manifesta com pujança extraordinária em nossos dias, é a do Senhor Santo Cristo dos Milagres. O centro de sua veneração é o Mosteiro da Esperança em Ponta Delgada, na ilha de São Miguel, no arquipélago dos Açores, situado cerca de 1.400 km de Lisboa.

O Senhor Santo Cristo é representado nesta devoção por um busto de tamanho superior ao de um homem, figurando Jesus no Pretório de Pilatos, depois de acoitado, com a face chagada pelos golpes e pelas bofetadas, a cabeça coroada de espinhos, encimando o seu rosto adorável e o peito aberto pela lança. Como rei de comédia, está sentado, tendo na mão uma cana, em vez de cetro, e um manto de púrpura para irrisão.

O tesouro da Imagem do Santo Cristo dos Milagres

Senhor Santo Cristo dos Milagres
Frutos dos mistérios da Fé, sinais da gratidão dos mortais pelos milagres que os ajudam a caminhar pela vida, o Tesouro, da imagem é impressionante.

O Resplendor, em platina cromada de ouro, pesa 4, 850 gramas e está incrustado de 6.842 pedras preciosas de todas as qualidades: topázios, rubis, ametistas, safiras, etc.

Além do valor artístico, esta jóia está carregada de elementos simbólicos ligados à teologia. O primeiro é a da Santíssima Trindade, representada por um triângulo no centro que contém três caracteres com o seguinte significado: “Sou o que Sou” e também “Pai, Filho e Espírito Santo”.

Deste triângulo irradiam os resplendores para as extremidades da peça.

O segundo elemento é a Redenção de Cristo, representada pelo cordeiro sobre a cruz e pelo livro dos Sete Selos do Apocalipse.

Um terceiro é a Eucaristia, simbolizada por uma ave, o pelicano, pelo cálice e pelo cibório.

O último elemento simbólico do Resplendor é a Paixão de Cristo passando pela coroa representada em pormenor: desde a túnica ao galo da Paixão, passando pela coroa de espinhos integralmente feita de esmeraldas.

Se o Resplendor é a jóia mais rica do Tesouro, a coroa é a sua peça mais delicada. Em ouro, pesando apenas 800 gramas, possui 1.082 pedras preciosas, todas elas trabalhadas com minúcia, onde os próprios espinhos são pequeníssimas pedras que diminuem de tamanho nas extremidades.

O relicário é, por outro lado, a peça mais enigmática do Tesouro. É a única que está permanentemente colocada no peito da imagem e serve para guardar o Santo Lenho, que se crê ser uma relíquia da verdadeira cruz em que Jesus foi crucificado.
Senhor Santo Cristo dos Milagres
O Cetro, a quarta peça do Tesouro, é constituída por duas mil pérolas que formam uma maçaroca de cana, 993 pedras preciosas ao longo do tronco e no conjunto de brilhantes com renda de ouro na base, onde está colocada a Cruz de Cristo.

Finalmente, as Cordas, com 5,20 metros de comprimento, constituem a quinta peça do corpo principal do Tesouro. São duas voltas de pérolas e pedras preciosas enroladas em fio de ouro.

As Jóias do Senhor Santo Cristo dos Milagres, como também a seleção de capas usadas pela imagem, podem ser admiradas no Convento de Nossa Senhora da Esperança.

Na origem da devoção, uma religiosa Clarissa
Senhor Santo Cristo dos Milagres com sacerdotes preparando-se para a procissão
A guarda da imagem do Senhor Santo Cristo está a cargo das Irmãs Clarissas, que começaram suas atividades apostólicas naquela ilha em 1541 (o arquipélago fora descoberto pelos portugueses em 1427).

Vem essa Congregação se dedicando ininterruptamente às obras religiosas e mais especialmente ao culto do Senhor Santo Cristo, mesmo durante a era pombalina, em que as Ordens Religiosas foram proibidas e perseguidas por força das leis portuguesas.

Tal devoção começou a tomar o brilho que ela hoje possui a partir de 1683, quando fez os votos solenes, em 23 de julho, a Madre Teresa d’ Anunciada, conhecida como a freira do Senhor Santo Cristo.

Esta madre, falecida com fama de santidade em 16 de maio de 1738, dedicou sua vida a Nosso Senhor Jesus Cristo, honrando de maneira única Sua imagem de “Ecce Homo”, por cujo culto se bateu a vida toda com um amor abrasado e dedicação absoluta.

Na sua autobiografia, escrita por ordem de seu confessor, lê-se: “Para Deus, por mais que se faça, não é nada. Para o que Sua Majestade merece, tudo o que Ele quiser, estou pronta”.
Senhor Santo Cristo dos Milagres
O amor desta alma a Nosso Senhor levou-a a honrar de maneira única a Sua imagem do “Ecce Homo”, que encontrou pobre, quase abandonada e escondida havia mais de cem anos numa dependência do Convento.

Tal imagem havia sido doada pelo Papa Paulo m a duas religiosas que tinham ido a Roma especialmente com o objetivo de pedir autorização para fundarem um convento em Ponta Delgada, Açores.
Igreja decorada para a festa do Senhor Santo Cristo dos Milagres
Dizia Madre Teresa: “Todo o meu cuidado era solicitar coisas muito ricas para adorno do meu Senhor e tratá-Lo com aquele culto e decência que merece Sua Pessoa: Em tudo que necessitava o Senhor, fui sempre impertinente em procurar; e quando alcançava os objetivos, dizia: “Tudo seja para sua maior glória”.

Retribuindo tal dedicação, Jesus operava prodígios para atender às suas orações e, como Ele próprio lhe revelou, “tu és o meu nada, e Eu sou o teu tudo”.

Os milagres, que se obtêm por intermédio de orações ao Senhor Santo Cristo, são numerosíssimos. Na vida de Madre Teresa d’ Anunciada eles foram contínuos, estando, ainda hoje, na Ermida de Nossa Senhora da Paz, consignados os relatos de esplêndidos feitos miraculosos.

Tremores de Terra e manifestação de Nosso Senhor estão na origem da procissão
Senhor Santo Cristo dos Milagres, com coro cantando o hino em honra dele
No ano de 1700, a Ilha de S. Miguel foi abalada por fortes e repetidos tremores de terra. Duravam estes já vários dias quando a Mesa da Misericórdia e grande parte da nobreza da cidade, vendo que os terremotos não cessavam, resolveram ir à portaria do Mosteiro da Esperança para levarem em procissão a Imagem do Santo Cristo.

Ao princípio da tarde desse dia 13 de Abril de 1700, juntaram-se as confrarias e comunidades religiosas. Concorreu igualmente toda a nobreza e inumerável multidão que, com viva fé, confiava se aplacaria a indignação divina com vista da santa Imagem.

Caminhava já a procissão em que todos iam descalços; e logo que a veneranda Imagem se deixou ver na portaria, foi tão grande a comoção em todos que a traduziram em lágrimas e suspiros, testemunhos irrefragáveis da contrição dos corações.

Levaram o andor do Santo Cristo as pessoas mais qualificadas em nobreza. Andando a procissão, ia a veneranda Imagem entrando em todas as igrejas onde, em bem concertados coros, Lhe cantavam os salmos “Miserere mei Deus”.

Saindo da Igreja dos Jesuítas, e caminhando para a das Religiosas de Santo André, não obstante toda a boa segurança e a cautela com que levavam a santa Imagem, com assombro e admiração de todos, caiu esta fora do andor e deu em terra. Foi esta queda misteriosa, porque não caiu a Imagem por algum dos lados do andor, como era natural, senão pela parte superior do dossel.

O povo ficou aflito com sucesso tão estranho. Uns feriam os peitos com as pedras; outros, pondo a boca em terra, que julgavam santificada com o contacto da santa Imagem, pediam a Deus misericórdia; estes, tomando os instrumentos de penitência, davam sobre si rijos e desapiedados golpes, regando a terra com o sangue das veias; aqueles publicavam em alta voz as suas culpas, como causas da indignação do Senhor; e todos, com clamores e enternecidos suspiros, pediam a Deus que suspendesse as demonstrações da sua justa vingança.

Verificaram, então, que a santa Imagem não experimentara com a queda dano considerável, pois somente se observou no braço direito uma contusão. A Imagem foi lavada e limpa no Convento de Santo André e, colocada outra vez no andor com a maior segurança, continuou a procissão, na qual as lágrimas e soluços do povo aflito embargavam as preces, até que, bem de noite, se recolheu no Mosteiro da Esperança.

E a cólera divina se aplacou…

Na procissão, resplandece majestade real
Senhor Santo Cristo dos Milagres, na procissão
O jogo de expressões fisionômicas da Imagem, tocando a todos individualmente, conforme as disposições interiores de cada um, tem todavia uma característica central e predominante: o olhar.

Este olhar convida a todos que retribuam àquele imenso e divino amor com uma total dedicação e entusiasmo na implantação do Reino de Nosso Senhor Jesus Cristo aqui na Terra.

A face marcada pelos dramas da Paixão não tira o aspecto de majestade que se desprende daquele busto. Ele próprio revelou a madre Teresa o desejo de que fosse glorificado como Rei, o soberano Senhor, tanto no convento como fora dele.

É por isto que é realizada a procissão do Senhor Santo Cristo pela cidade, no domingo imediatamente anterior à festa da Ascensão, tendo esta devoção começado por volta do ano de 1700.

Nessa procissão e a quantos dela participam, Ele aparece ao povo da ilha, através da imagem, como o “Senhor”, o “Rei Absoluto”. As manifestações da população e das Forças Armadas, os tapetes de flores, todo o brilho dado à celebração constituem homenagens a essa realeza.

Não é, pois, de admirar o que escreve Madre Teresa em sua autobiografia, sobre o que o Senhor lhe ordenou: “Teresa, manda-Me buscar as insígnias reais: coroa de espinhos, resplendor e cana. Eu quero que ele (o rei D. João V de Portugal) Me mande fazer as três insígnias reais de ouro e diamantes e pedras preciosas, como de rei para rei”

Compreende-se assim o culto prestado ao Senhor Santo Cristo, ornado de jóias preciosas deslumbrantes e de tal magnitude que ultrapassa a de coroas dos maiores potentados. Mas o grande e valioso relicário está no peito da imagem, que encerra uma relíquia da verdadeira Cruz de Cristo, o Santo Lenho.

É fato digno de nota que a primeira aparição de Nossa Senhora de Fátima, a 13 de maio de 1917, se deu no mesmo dia em que se realizava, em Ponta Delgada, a procissão do Senhor Santo Cristo.

Afluência popular, milagres e graças

Senhor Santo Cristo dos Milagres
Muito se poderia dizer sobre os milagres que continuamente se operam por intermédio da devoção ao Senhor Santo Cristo.

Todos os dias os fiéis, em grande número, ajoelham-se junto às grades que no Santuário separam a igreja do coro de baixo, onde está a capela do Senhor Santo Cristo, construída pela Madre Teresa, segundo desenho arquitetônico inspirado pelo próprio Nosso Senhor Jesus Cristo.

Ali oram e louvam ao Senhor; ali pedem graças, curas de doenças, a solução de problemas difíceis na sua vida; ali fazem seus votos, suas promessas; ali agradecem ao Senhor as graças obtidas; ali fazem suas ofertas, por vezes muito generosas.

É impressionante a afluência de centenas de fiéis às sextas-feiras, durante todo o ano. Não há uma única sexta-feira em que a igreja não esteja repleta, e muitas vezes acontece terem eles de ficar nas dependências, ou mesmo fora delas, por falta de espaço.

A festa do Senhor Santo Cristo dos Milagres celebra-se no quinto domingo após páscoa.

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Festa de Corpus Christi, devoção que teve sua origem na Idade Média

Corporal ensanguentado de Bolsena que está na Baslica de Orvieto aonde pode ser visto e venerado pelos fieis

Festa de Corpus Christi, devoção que teve sua origem numa visão e milagre eucarístico na Idade Média

Na Idade Média, os homens tinham uma devoção enlevada pela pessoa de Nosso Senhor Jesus Cristo. Para libertar seu túmulo dos muçulmanos fizeram-se as cruzadas. A história da festa de Corpus Christi tem origem nessa devoção.

No final do século XIII surgiu em Lieja, Bélgica, um Movimento Eucarístico cujo centro foi a Abadia de Cornillon fundada em 1124 pelo Bispo Albero de Lieja. Este movimento deu origem a vários costumes eucarísticos, como por exemplo, a Exposição e Bênção do Santíssimo Sacramento, o uso dos sinos durante a elevação na Missa e a festa do Corpus Christi.

Visão sobre a devoção ao Santíssimo Sacramento

A abadessa Santa Juliana de Mont Cornillon ardia em desejos de que o Santíssimo Sacramento tivesse uma festa especial. Ela teve uma visão em que a Igreja aparecia como uma lua cheia com uma mancha negra, sinal da ausência da solenidade.

Santa Juliana comunicou a visão a vários prelados. Entre estes estava o futuro Papa Urbano IV.

O bispo Roberto de Lieja, em 1246, instituiu a celebração na diocese. O exemplo se estendeu especialmente por toda a atual Alemanha.

Milagre Eucarístico de Bolsena

Em 1263, Pedro de Praga, padre alemão, estava celebrando Missa na Igreja de Santa Cristina em Bolsena. Ele vinha entretendo sérias dúvidas sobre a realidade da presença de Cristo na Hóstia consagrada. Assim que ele completou as palavras da Consagração, o Sangue começou a escorrer da Hóstia Consagrada e correr por suas mãos abaixo, sobre o altar e sobre o linho (corporal). Vendo isto, ele interrompeu a Missa e viajou depressa a Orvieto onde o Papa Urbano IV residia.

Ao ouvir a história dele, o Papa o perdoou por ter dúvidas e enviou os representantes a Bolsena, para investigarem. Paroquianos e outras testemunhas confirmaram a história do padre; e a Hóstia e os linhos manchados estavam lá para todos verem.

Festa de Corpus Christi instituida pelo Papa Urbano IV

A investigação confirmou tudo aquilo que o padre havia relatado. Um ano depois, em agosto 1264, o Papa Urbano IV instituiu a Festa de Corpus Christi (Corpo de Cristo). Este corporal conserva-se até hoje na basílica de Orvieto – construída, aliás, para guardá-lo – onde pode ser visto e venerado pelos fiéis.

O Santo Padre movido pelo prodígio, e a pedido de vários bispos, fez com que se estendesse a festa do Corpus Christi a toda a Igreja por meio da bula “Transiturus” de 8 setembro do mesmo ano, fixando-a para a quinta-feira depois da oitava de Pentecostes e outorgando muitas indulgências a todos que assistirem a Santa Missa e o ofício.

O Papa Urbano IV encarregou um ofício e a liturgia das horas a São Boaventura e a Santo Tomás de Aquino; mas quando o Pontífice começou a ler em voz alta o ofício feito por Santo Tomás, São Boaventura foi rasgando o seu em pedaços.

A festa foi estendendo-se a toda a Igreja a partir do século XIV.

Quando os protestantes negaram a Presença Real de Nosso Senhor Jesus Cristo na Hóstia consagrada, o Concílio de Trento reforçou o costume e dissipou os contestatários, determinado que fosse celebrado este excelso e venerável sacramento com singular veneração e solenidade; e reverente e honorificamente seja levado em procissão pelas ruas e lugares públicos.

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Refeição, convívio e civilização

Les très riches heures du Duc de Berry. Banquete medieval. Note-se que ainda não se utilizavam talheres, um progresso que veio depois. Ao fundo, uma cena de batalha (está em curso a Guerra dos Cem Anos, entre a França e a Inglaterra)

Alimentar-se é um ato banal? – Para o homem moderno, habituado à banalidade, certamente. Mas, em si, é ação nobre e rica em significados.

Quis Deus colocar no alimento a prova de nossos primeiros pais. O “fruto proibido” que está na raiz do pecado original simbolizava, a seu modo, algo mais alto do que o simples fato de comer.

Alimentar-se é manter a vida. Mas o homem, criatura racional, não se alimenta como um bicho. A refeição é um ato familiar por excelência, e como ato social pede certo protocolo, certo cerimonial. Protocolo e cerimonial que impõem ao homem o exercício da virtude da temperança.

Em remotíssima era já vemos Abraão desdobrar-se em gentilezas para oferecer hospitalidade a três desconhecidos que passavam por sua tenda. Na realidade eram anjos que vinham anunciar-lhe a vocação de patriarca (Gen. 18, 1-8). E o melhor ato de cortesia era oferecer uma refeição aos viajantes.

Quando os judeus fugiram do Egito com Moisés, Deus mandou-lhes do Céu o maná para alimentá-los. E nas vésperas de sua Paixão e Morte, Jesus quis que sua última ceia fosse ocasião para instituir o mais santo e sublime dos sacramentos: a Eucaristia, que é o próprio Corpo e Sangue de Cristo, com sua alma e divindade. Tendo Ele se encarnado, desejou que os homens participassem da graça divina pela Comunhão eucarística. Haverá algo mais elevado?

Após a Ressurreição, apareceu Jesus aos discípulos de Emaús e comeu com eles. O mesmo fez com os Apóstolos surpresos: “Tendes aí alguma coisa que se coma?“. Deram-Lhe uma posta de peixe assado; e, tomando-a, comeu diante deles (Lc 24, 41).

Por isso é natural que os homens dêem graças a Deus pelo alimento que recebem e peçam a bênção divina. Ainda que não se considere o aspecto religioso, a refeição é de si um ato humano que se reveste de dignidade.

Será simples e discreto na vida diária, será mais formal e até requintado nas ocasiões solenes.

Talvez se possa até medir o grau de civilização de um povo segundo o modo de ele se alimentar. O índice maior ou menor de solenidade nas refeições poderia significar progresso ou decadência.

O Império Romano, admirável por tantos lados, serve de exemplo. É sabido que os romanos pagãos facilmente se entregavam a degradantes orgias. Propensos à gula, muitos, tendo comido em excesso, mandavam os escravos introduzirem penas em suas gargantas a fim de provocar o vômito, e assim poderem continuar no banquete. É repugnante.

Muitos povos bárbaros que se converteram ao Cristianismo, ao contrário, progrediram nesse aspecto de modo notório, conferindo maior solenidade às refeições importantes.

Desse modo se condensou, ao longo dos séculos, uma série de normas sobre o modo de servir, regras de cortesia ou etiqueta, protocolos que indicam a posição dos comensais segundo a hierarquia social, constituindo um mundo que facilita e eleva o convívio humano.

Assim, é sinal de civilização quando, mesmo nas refeições diárias mais simples, certas regras de protocolo são observadas: o pai ou chefe de família preside; a mãe o secunda; os filhos, os demais familiares ou os convidados se distribuem não necessariamente conforme as idades, mas conforme as conveniências e costumes.

Outrora a autoridade do chefe de família era tal que, mesmo quando se recebia o próprio rei, a cabeceira principal cabia ao dono da casa. Em seu lar, o pai de família é o rei… como o rei deve ser o pai de seu povo.

Entretanto, o cerimonial só tem autenticidade se praticado por pessoas que lhe dão valor. Ele pode alcançar a perfeição se tiver como lastro a caridade cristã, que manda amar o próximo como a si mesmo. Nesse caso, estabelece-se facilmente uma espécie de liturgia social na qual primam o respeito, a noção de honra, de cortesia.

As doçuras do bom trato não excluem os temperos amargos do sacrifício, pois onde há cerimonial há hierarquia, desigualdade, superiores e inferiores; uns mandam, outros obedecem, o que é natural para um espírito católico mas não é suportável para o orgulho humano quando não contido. Um sorriso pode custar mais que uma jóia.

Por isso o Divino Mestre, ao ver no Cenáculo que os Apóstolos discutiam entre si questões de precedência, quis dar-lhes uma lição de humildade lavando-lhes os pés: “O maior deverá fazer-se o menor, e o que manda será como um servidor dos outros“. Porque mais importante do que reinar neste mundo é alcançar o reino dos céus (cf. Lc 22, 24-30).

A felicidade do convívio humano encontra-se sobretudo no amor ao próximo por amor de Deus.

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Ladainha da Humildade

Cardeal Rafael Merry del Val, secretário de estado de São Pio X


Ó Jesus, manso e humilde de coração, ouvi-me.
Do desejo de ser estimado, livrai-me, ó Jesus.
Do desejo de ser amado, livrai-me, ó Jesus.
Do desejo de ser conhecido, livrai-me, ó Jesus.
Do desejo de ser honrado, livrai-me, ó Jesus.
Do desejo de ser louvado, livrai-me, ó Jesus.
Do desejo de ser preferido, livrai-me, ó Jesus.
Do desejo de ser consultado, livrai-me, ó Jesus.
Do desejo de ser aprovado, livrai-me, ó Jesus.

Do receio de ser humilhado, livrai-me, ó Jesus.
Do receio de ser desprezado, livrai-me, ó Jesus.
Do receio de sofrer repulsas, livrai-me, ó Jesus.
Do receio de ser caluniado, livrai-me, ó Jesus.
Do receio de ser esquecido, livrai-me, ó Jesus.
Do receio de ser ridicularizado, livrai-me, ó Jesus.
Do receio de ser infamado, livrai-me, ó Jesus.
Do receio de ser objeto de suspeita, livrai-me, ó Jesus.

Que os outros sejam amados mais do que eu, Jesus, dai-me a graça de desejá-lo.
Que os outros sejam estimados mais do que eu, Jesus, dai-me a graça de desejá-lo.
Que os outros possam elevar-se na opinião do mundo, e que eu possa ser diminuído, Jesus, dai-me a graça de desejá-lo.
Que os outros possam ser escolhidos e eu posto de lado, Jesus, dai-me a graça de desejá-lo.
Que os outros possam ser louvados e eu desprezado, Jesus, dai-me a graça de desejá-lo.
Que os outros possam ser preferidos a mim em todas as coisas, Jesus, dai-me a graça de desejá-lo.
Que os outros possam ser mais santos do que eu, embora me torne o mais santo quanto me for possível, Jesus, dai-me a graça de desejá-lo.

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